segunda-feira, 3 de março de 2008

por entre as persianas





Por entre as persiana eu vejo um outro mundo.
Não, ele não é igual ao seu.
Meu mundo é em preto e branco, com as listras brancas-amareladas das persianas.
Não, eu não coloco meus dedos entre elas para as entreabrir.
Eu paro um pouco em cada ponto. Em cada vírgula.
Eu ouço a voz de uma mulher em meio a fumaça.
Ela declama meus pensamentos.
Aqui as pessoas são intensas.
Os olhares são sempre significativos. Todos eles.
A naturalidade é nata. Assim, segue a individualidade.
E de vez em quando aparece um cinsa por meio a essa bagunça.
Agora os bares servem apenas para beber.
Não existem sorrisos.
Não existem galanteios.
Não existem pessoas boas ou más.
Elas são tudo isso e muito mais em um grau mais, bem mais elevado.
As baratas, os ratos, eu não sei se morreram todos ou se eles se esconderam covardes.
Animais eu já não vejo a tempos, mesmo ates disso tudo ficar assim.
Os gatos foram os que duraram mais, se tornaram pessoas.
E cada vez mais independentes.
As formigas, foram esmagadas, esse mundo não é para pequenos.
Assim se foram os grilos, outros insetos e crianças.
Observo minha roupa.
São retalhos. Rasgados. De um pano preto de pequenas bolotas pretas que formam círculos.
Não existe mais sol, apenas uma luz, não muito forte, não muito quente.
Mas o suficiente para manter alguns de vestidos, outros de casacos.
Meu reflexo pelo espelho da janela, não mudou muito.
Estou mais branca, despenteada, muita maquiagem preta borrada.
As persianas estão rasgadas e sujas, mas não me incomoda.
Meu aspecto de abandono não é feio ou mal visto. Todos estão assim.
Eu não sinto fome ou sede.
Apenas uma sensação de bem estar misturada com amor e tédio.
As pessoas não conversam, apenas se olham, não é exatamente uma comunicação.
Todos estamos machucados, como últimos sobreviventes de uma guerra.
Apesar da sujeira da poeira, não há nada muito quebrado.
Apenas algo como uma degradação do tempo e o abandono.
Não sentimos sono, assim como não sentimos nenhum incomodo ou dor.
Não há o que pensar, apenas observo.

Um comentário:

Anônimo disse...

"As pessoas não conversam, apenas se olham, não é exatamente uma comunicação.
Todos estamos machucados, como últimos sobreviventes de uma guerra.
Apesar da sujeira da poeira, não há nada muito quebrado."

Não sabemos se o que aconteceu foi nossa culpa.
Não sabemos de nada.
estamos.
Estamos nesse depois de algo.
Andamos e olhamos, não agimos, não sentimos.
É como se aqui fosse algo etéro.
Estamos olhando há demasiado tempo.
talvez um dia voltemos a desejar, então ajamos.
talvez a lembraça do Desejo se desfaça em pó por sobre a penteadeira corroída pelo tempo, ela mesma correóda pelo tempo também.